O PERIGO DA ESQUERDA
Hoje que a esquerda é apenas pálida lembrança de tempos sinistros e fracassados, ainda assim, muitos saudosistas insistem em cortejá-la. Apesar
dos insucessos e dos melancólicos exemplos, o continente sul-americano,
sempre na contramão da história, continua extasiando-se com o
draconiano esquerdismo diametralmente oposto à democracia. Hugo Chávez,
Evo Morales, Cristina Kirchner, Rafael Correa, Fernando Lugo et cetera,
nem mesmo tentam disfarçar o êxtase pelo poder e a tendência à tradição
autoritária, estatizante e antiliberal. Aqui no Brasil, tivemos um
bocado de sorte porque Lula, que sempre foi íntimo de Chávez, Evo
Morales e Fidel Castro, não foi por esse caminho -- embora tenha tentado
algumas medidas autocráticas, como amordaçar a imprensa, por exemplo, e
expulsar jornalistas. Felizmente, não foi possível, ou melhor, a
sociedade impediu ou dificultou essa pretensão. Mas, o perigo permanece.
Ainda está recente na memória dos brasileiros o Caso Battisti. Nesta
oportunidade, quero confrontá-lo com o Caso Rauff, no Chile. O leitor
poderá tirar suas conclusões a respeito da ideologia de Lula e Salvador
Allende, aquele mesmo que foi deposto pelas forças chilenas.
Se há ainda alguns que pensem uma história injusta com Salvador Allende
é porque desconhecem a verdade dos fatos. Ele cometeu muitos excessos e
manchou sua biografia. Se aqui Lula continua insistindo sobre a “farsa”
do mensalão, sobre a “herança maldita”, lá, Salvador Allende também
escorregou muitas vezes, tentando impor uma política nazista e racista.
Mas, vamos aos casos Rauff e Battisti.
Tanto Lula quanto Allende protegeram dois assassinos. Walther Rauff, um
dos maiores criminosos nazista, foi responsável pelo assassinato de 100
mil judeus e criador, por encargo de Eichmann, do sistema de caminhões
de gás, que exterminou meio milhão de seres humanos. Cesare Battisti é
aquele terrorista italiano, foragido da Justiça, integrante do grupo
Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), que matou quatro pessoas: um
joalheiro, um policial, um carcereiro e um militar.
Chilenos e brasileiros esperavam pela expulsão desses facínoras de seus
territórios, entretanto, isso não aconteceu nem com Rauff nem com
Battisti. A revelação, no Chile, de que Allende negou-se a fazer uso de
sua atribuição presidencial para expulsar do país todo estrangeiro cuja
presença afetasse os interesses da nação e entregá-lo à Justiça, foi
motivo de consternação, surpresa e amargura. Enquanto personagens
políticos conservadores, como Margareth Tatcher, exigiam, nos anos 80, a
entrega de criminosos de guerra, Allende, socialista e revolucionário,
surgia como encobridor de um dos maiores criminosos conhecidos pela
humanidade. No Brasil, a atitude de Lula, no intuito de dar um rosto
humano a um governo indulgente com a corrupção, concedeu refúgio ao
terrorista, como o derradeiro ato de seu mandato. O Supremo Tribunal
Federal (STF) aprovara o parecer de Gilmar Mendes favorável à
extradição, mas concedeu a recomendação final a Lula que,
aproveitando-se da brecha, ratificou sua empáfia e megalomania, e
contrariou o pensamento dos magistrados e a expectativa da nação,
permitindo a permanência do assassino foragido entre nós. Obviamente,
muitos países europeus, assim como no Caso Rauff, decepcionaram-se com o
gesto lulista que passou por cima da sentença de prisão perpétua
imposto pela Itália ao criminoso.
A história registra vários casos em que, por atribuição presidencial, se expulsa uma “persona non grata”, como o que ocorreu, por exemplo, com Néstor Kirchner ao entregar o criminoso Paul Schäfer ao Chile. Aqui, as coisas não funcionam assim: Tarso Genro fez um carnaval em torno do Caso Battisti, atribuindo grande parte do bulício e do blá-blá-blá à imprensa. Felizmente, porém, os petistas, embora tenham tentado, ainda não conseguiram tapar a boca da mídia, a salvaguarda da democracia. Em todos os países onde ela é amordaçada, a democracia periclita e o estado de direito é ameaçado. Gosto muito daquela frase do polonês Stanislaw Lec: “Imparcialidade não é neutralidade. É parcialidade por justiça.” Bonita a declaração de Fernando Henrique Cardoso em seu livro A soma e o resto: “Se me perguntarem como gostaria de ser lembrado, diria que sempre fui democrata. Em todas as circunstâncias de minha vida fui democrata. Exerci o poder democraticamente, portanto, aceitando o outro, negociando, buscando convencer, não impor, tentando que as transformações se fizessem com base em pontos de convergência.” O que conta para o político é o julgamento da história. E o julgamento da história muda. Quem hoje é tido como milagreiro, amanhã poderá ser julgado pelo que está contido em suas entranhas. A história é repensada o tempo todo. Como dizia uma escritora inglesa do século XVIII, “é de justiça, e não de caridade, que o mundo precisa”.
Dra. Maria da Glória De Rosa
mg-de-rosa@hotmail.com
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